Final do próximo mês. Este é o novo prazo estimado para a entrega dos 43,5 quilômetros do Trecho Leste do Rodoanel Mário Covas, o penúltimo antes da conclusão do anel viário de São Paulo. A obra, integralmente realizada pela iniciativa privada, está atrasada. Por isso, a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado (Artesp) promete aplicar multas.
O trecho está em construção desde agosto de 2011, cinco meses depois de o contrato entre a concessionária SPMar e o Governo do Estado ser assinado, em março. O prazo de três anos (36 meses) começou a contar após a formalização do acordo. Portanto, era esperada a conclusão da pista há aproximadamente dois meses. Ciente de que não poderia cumprir, a empresa pediu mais 90 dias.
Por enquanto, a previsão está mantida e não há intenção, oficialmente, de mais adiamentos. A extensão Leste promete encurtar em pelo menos um terço o tempo de viagem entre o Porto de Santos e o Aeroporto Internacional de São Paulo, o de Cumbica, em Guarulhos. Todo o projeto custou R$ 3,2 bilhões, nenhum centavo proveniente do poder público.
A Tribuna percorreu metade da nova autopista. Muitos operários preocupavam-se em finalizar detalhes essenciais, como a faixa branca que divide as pistas. Enquanto isso, outros ainda tinham a tarefa de construir as vias – como em um lote de 300 metros, próximo ao Túnel Santa Luzia, onde, em chão de terra, equipamentos dividiam espaço com grandes rochas que ainda precisavam ser fragmentadas.
Há trechos onde ainda não há pavimentos ou muretas de proteção, por exemplo. Mas o que preocupa é a construção de um túnel de 70 metros em Ribeirão Pires, que foi iniciada na última semana. Nesse ponto, há uma linha férrea utilizada pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e pela concessionária ferroviária MRS e dutos químicos da Braskem – obstáculos que precisaram ser contornados, o que atrasou os trabalhos.
Esse cenário e a falta de porta-vozes da empresa para falar sobre a obra fortalecem o parecer de fontes consultadas pela Reportagem:a entrega do Trecho Leste pode ocorrer somente no próximo semestre.
Se isso acontecer, a Artesp garante multar a SPMar, concessionária que também administra o Trecho Sul do Rodoanel, em funcionamento desde 2010. Os valores não estão fechados. Só serão calculados na medida em que os lotes forem entregues – caso todo o Trecho Leste não seja liberado de uma única vez. Os três meses de aditamento também serão considerados.
Diferencial
Além de Ribeirão Pires, o Rodoanel Leste passa por Arujá, Mauá, Poá, Itaquaquecetuba e Suzano, cidades da Região Metropolitana de São Paulo. Diferentemente dos demais trechos, este será iluminado e terá um dos traçados de pontes e viadutos mais compridos de todo o Brasil: 16,8 quilômetros (maior que a ponte Rio-Niterói).
O modelo de concessão é diferente daquele adotado em projetos semelhantes no Brasil: todo o investimento é privado. A concorrência foi vencida pela SPMar, cuja oferta apresentava um deságio de 63% ante o preço predefinido. A cifra apresentada foi aplicada na construção, em desapropriações, no reassentamento e em projetos ambientais. O retorno do investimento está previsto para acontecer em até 20 anos.
A concessionária poderá administrar o trecho por pelo menos 32 anos. Nos próximos dois, deverá ocorrer a interligação com os 44 quilômetros do Trecho Norte, fechando, após mais de uma década, o Rodoanel que estava previsto para ser concluído pelo Estado ainda no final do último século.
Parte Norte será entregue no início de 2016
Está mantida para o primeiro semestre de 2016 a entrega do último trecho do Rodoanel Mário Covas, o Norte. Com 44 quilômetros de extensão, ele é construído por seis empresas, que disputaram uma licitação internacional (a maior da época). O valor total do empreendimento, gerenciado pela Desenvovimento Rodoviário S/A (Dersa), empresa do Estado, é de R$ 5,6 bilhões.
Apesar de o presidente da estatal, Laurence Casagrande Lourenço, admitir que o modelo rodoviário de transporte de cargas está no limite, ele acredita que o trecho contribuirá e muito para retirar, do Centro de São Paulo, os veículos comerciais que têm como destino o Porto de Santos. Com a parte Norte, o Rodoanel interligará as rodovias Presidente Dutra e Fernão Dias com o Sistema Anchieta-Imigrantes, principal acesso terrestre ao cais santista.
A Tribuna também esteve nas obras da última parte do anel rodoviário, ainda em São Paulo, mas às margens da Serra da Cantareira. No local, já foram erguidas as pilastras para um viaduto de 326 metros de extensão que ligará um dos túneis (de 744,42 metros) até um conjunto de pistas planas.
A expectativa é de que 75 mil veículos passem por dia pelo Trecho Norte. Destes, 35 mil serão só caminhões – 18 mil deixariam de entrar em São Paulo em direção a outros destinos, como o complexo santista. Segundo a Dersa, a rodovia é chamada de Classe Zero – tem controle de acesso, sete faixas de rolagem e velocidade liberada de 100 Km/hora.
INTEGRAÇÃO
Além disso, apesar de a estatal paulista ainda aguardar uma definição da União quanto à construção da parte Norte do Anel Ferroviário de São Paulo, o Ferroanel, a obra do Rodoanel já realiza 16 quilômetros de terraplanagem para a linha férrea (que, nessa região passará ao lado da via expressa). Lourenço explica que a intenção é agilizar a implantação do tramo ferroviário.
“O Rodoanel é definitivo, mas no futuro teremos que ter a noção de que haverá a necessidade de contornar a macro metrópole paulista”, explica o presidente da Dersa. Segundo ele, o sistema todo interligado trará benefícios imediatos, mas não será capaz de atender a demanda futura, uma vez que as cidades deverão crescer e, naturalmente, ultrapassá-lo.
Professor da Unicamp defende 2º anel viário
Assim como acredita o presidente da Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa), Laurence Casagrande, já é preciso pensar em um novo anel viário, ainda mais externo à macro-metrópole. Este também é o entendimento do professor doutor Carlos Alberto Bandeira Guimarães, especialista no setor rodoviário da Universidade de Campinas (Unicamp). O pesquisador alerta, por sua vez, que os estudos comecem o quanto antes.
O acadêmico tem como base o crescimento progressivo do transporte de cargas – principalmente em direção ao Porto de Santos, que prevê dobrar sua movimentação e atingir 230 milhões de toneladas por ano até 2024. Grande parte dessas mercadorias, porém, permanecerá sendo levada pelo modal rodoviário, por limitações estruturais e logísticas.
“Se estivéssemos no cronograma original, já poderíamos estar ampliando o que já existe”, pondera Guimarães, em referência aos constantes atrasos que o complexo viário teve desde sua concepção, no início deste século. Ele sugere às autoridades estaduais que não deixem o sistema de estradas chegar ao limite, gerando transtornos.
O professor lembra que, quando foi inaugurado o Trecho Sul do Rodoanel, a Avenida dos Bandeirantes, na Capital, reduziu drasticamente seu índice de congestionamento. No entanto, não precisou passar muito tempo para os carros tomarem o lugar dos caminhões – o que mostra a necessidade de levar em consideração o aumento da frota de automóveis.
Nas próximas duas décadas, uma alternativa ao Rodoanel terá de existir, afirma o especialista. A tendência, segundo ele, é aprimorar a mobilidade onde há grande concentração urbana, como São Paulo. “Se houver mais investimento nas ferrovias, por exemplo, é possível ter uma migração da carga em contêineres. Menos caminhões nas ruas, maior equilíbrio”.